O apóstolo João retorna a um tema que já havia tratado na primeira carta, porém enquanto a primeira se assemelha mais um sermão se tratando de uma carta geral, essa segunda carta embora também traga o combate ao docetismo é dirigida a uma pessoa especificamente embora alguns pensem que o termo senhora eleita possa se referir a uma igreja, no entanto seria algo bem incomum não ocorrendo nada parecido em nenhum outro local.
Logo após aos cumprimentos iniciais onde João demonstra alegria pela fidelidade da família da destinatária ele introduz o assunto principal, o combate aos falsos mestres. Mais uma vez é a questão de alguns que insistem na ideia de que Jesus não encarnou de fato, e ele diz que quem assim prega está no papel de enganador e anticristo. Depois ele adverte que tais pessoas não deveriam sequer ser recebidas para que não seja contado junto com o que ele chama de obras más.
Mas o que é e qual a importância da humanidade de Jesus?
Primeiramente uma olhada nos evangelhos não deixará qualquer duvida que Jesus foi de fato um homem, fisicamente falando, em carne e osso, um homem que sentia fome, sede, chorava, ria, sentia dor, sangrava e que tinha ossos para serem quebrados, podia ser tocado.[1]
Não há nas escrituras nenhuma possibilidade de argumentação contrária a esse fato. Sua divindade até foi questionada e Ele defendeu-a mas sua humanidade em nenhum momento foi posta em dúvida.
Mas porque era assim tão importante essa questão para que João gastasse tanto tempo com ela? Se Jesus não tivesse sido um homem de fato e fosse apenas uma aparição em forma de homem como poderia ele então ter morrido pelos nossos pecados? Não vamos aprofundar demais essa parte da cristologia que poderá ser revisada em compêndios de teologia sistemática, mas se cremos que o pecado entrou no mundo por um homem, Adão e dessa forma se estendeu a toda a humanidade que se tornou decaída, apenas pelo sacrifício vicário de um homem, sem mácula e sem pecado, essa humanidade poderia ser restaurada.
Se abrimos mão da humanidade de Cristo teremos que necessariamente abrir mão da doutrina do pecado original, e desprezar a necessidade do sacrifício de Jesus. Todo arcabouço doutrinário do antigo e do novo testamentos ruiriam e não fariam sentido em nada desde o animal morto, sacrificado, para cobrir de peles e esconder a nudez vergonhosa pelo pecado de Adão e Eva.
A Carta aos Hebreus insiste em que, se Jesus não tivesse compartilhado de todas as facetas da experiência humana, com exceção do pecado, não estaria qualificado para ajudar-nos em tais provações[2], por ter passado por tudo isso é que podemos recorrer a Ele sempre que necessário, Ele foi tentado e resistiu e venceu as tentações portanto pode nos acudir quando estivermos na mesma situação.
Cristãos que se concentram na divindade de Jesus têm, às vezes, pensado que minimizar sua humanidade é motivo de honra para Jesus. Alguns chegam a pensar que as demonstrações da fraqueza humana em Jesus eram apenas fingimento porque como Deus estaria acima de tudo isso. Mais uma vez, se assim fosse Jesus não estaria vivenciando a humanidade sem pecado para se oferecer em sacrifício vivo e agradável a Deus, e aqui entre nós não passaria de uma hipócrita se assim procedesse, e seria impossível porque implicaria em pecado.
Porém a Encarnação significa que o Filho de Deus era uma só Pessoa, que subsistia em duas naturezas, e que nada faltou nem a sua natureza divina nem a à sua natureza humana, exceto o pecado. Um outro problema é imaginar que hora Jesus agia pela sua natureza divina e hora agia pela sua natureza humana, tipo uma chave seletora. As duas naturezas de Cristo estavam presentes e atuantes em todos os momentos. Jesus não podia pecar, mas podia ser tentado. Satanás tentou-o a desobedecer ao seu Pai através da autossatisfação, da auto-exibição e da auto-exaltação[3], além desse evento no deserto Jesus sofreu tentação também para fugir da cruz[4] .
Jesus precisou lutar contra a tentação, como no Getsemani, porém sua natureza divina o fez obedecer fielmente ao Pai.[5] Ele precisava suportar as tentações até o fim, sentindo toda a sua força, e emergisse vitorioso para seu povo, "... naquilo que ele mesmo sofreu, tendo sido tentado, é poderoso para socorrer os que são tentados"[6] .
Rejeitar a humanidade real de Cristo é rejeitar toda esperança de reconciliação com Deus, enquanto que aceitá-la é aceitar o próprio Deus.
Confesse que assim como eu você não achava que uma carta que é quase um bilhete de tão pequena pudesse conter tento conteúdo.
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