CARTA PASTORAL SOBRE DANÇAS
LITÚRGICAS E PALMAS NO CULTO PÚBLICO
Supremo Concílio 2010
Introdução
Em virtude da amplitude e
complexidade dos temas propostos, se faz necessário abordar nesta parte
preliminar da Carta alguns temas que provêm o fundamento para o tratamento dos
pontos centrais.
- Tipos de culto
Existe uma distinção entre a vida
cristã como culto constante a Deus (Dt 6.6,7; Cl 3.17), o culto individual (Mt
6.6), o culto familiar (Jó 1.5) e o culto público solene (Is 56.7; Hb 10.25).1 Os Princípios de Liturgia
seguem essa distinção, mencionando o culto público, em família e individual.2
Em diversos aspectos estas
modalidades de culto convergem. Em todas elas, buscamos servir a Deus de todo
coração, na mediação de Cristo e no poder do Espírito Santo (1Tm 2.5; 1Co 3.16;
Jo 14.26; 1Jo 2.27). Todavia, as mesmas diferem quanto às circunstâncias,
local, participantes e elementos que as compõem.
2.
Vida Cristã e Culto Público
A vida cristã é um culto
constante a Deus, que é oferecido individualmente, em qualquer tempo e lugar e
onde não é necessário que se exerçam os chamados elementos de culto, como por
exemplo, oração, cânticos e leitura da Bíblia.
O culto público é o ajuntamento
solene do povo de Deus, convocado para reunir-se em dia, hora e local
estabelecidos, com o objetivo de prestar serviço espiritual a Deus sob a
liderança de pessoas especialmente designadas para tal. Deste culto constam
elementos que serão abordados mais adiante nesta Carta Pastoral, alguns dos
quais não fazem parte da vida cristã como culto.
É preciso que se entenda
claramente que existe uma diferença fundamental entre nossa vida diária como
culto a Deus e o culto que a Ele prestamos publicamente, juntamente com os
demais irmãos em Cristo. Determinadas atividades que seriam pertinentes à nossa
vida como culto não seriam próprias a este culto público.
3.
O templo
O culto público a Deus pode ser
prestado em qualquer local pelo seu povo (Jo 4.21; Ml 1.11), não havendo para
isto local mais sagrado que outros, conforme ensina a Confissão:
Agora, sob o Evangelho, nem a
oração, nem qualquer outro ato do culto religioso é restrito a um certo lugar,
nem se torna mais aceito por causa do lugar em que se ofereça ou para o qual se
dirija, mas, Deus deve ser adorado em todo o lugar, em espírito e verdade…3
Apesar disso, as igrejas locais
podem reservar determinados espaços exclusivamente para o culto público, em
nome da conveniência e da propriedade.
O que caracteriza o culto público
não é sua realização num templo, mas a sua convocação, seu caráter público, a
presença dos elementos que o constituem como culto, bem como sua condução por
líderes para isto separados. Assim, quer seja no templo das igrejas, quer em
seus salões sociais ou acampamentos, ao ar livre ou em instalações quaisquer,
onde o povo de Deus, para isto convocado, se reunir com o propósito específico
de cultuar publicamente a Deus, ali temos um culto público e solene, o qual
deve ser realizado conforme o ensino das Escrituras.
Ao se buscar um local para o
culto público a Deus, deve-se levar em consideração a conveniência,
propriedade, facilidade, e outras circunstâncias que devem ser analisadas
sempre pelos princípios gerais da Bíblia e pelo bom senso. 4
4.
A Igreja Como Comunidade Social
As igrejas locais não são apenas
uma expressão visível da Igreja de Cristo. Elas também são comunidades que se
organizam socialmente. É admissível que atividades de cunho sócio-cultural
façam parte da vida das igrejas locais, como festividades relativas às datas do
calendário público, eventos de lazer e culturais, acampamentos, retiros, formação
de grupos por interesse cultural, encontros que visam simplesmente a
socialização dos membros, a discussão de temas da atualidade, ou até mesmo
atividades que visam proporcionar oportunidades de melhora profissional, como
cursos profissionalizantes e de línguas. Outro exemplo são as tradicionais
“reuniões sociais”, onde ocorrem brincadeiras, danças de roda, encenações, etc.
Assim sendo, é preciso fazer uma
distinção muito clara entre atividades de natureza social e cultural das
igrejas locais e aquilo que se faz no culto público a Deus. Muitas atividades
que são cabíveis, pertinentes e próprias à natureza social das igrejas locais
não devem ter lugar no culto, pois nem são elementos deste e nem contribuem
para que os referidos elementos sejam mais bem utilizados pelo povo de Deus.
Consequentemente, é preciso que
os pastores e presbíteros das igrejas locais instruam as suas igrejas acerca
desta diferença, de preferência ao início das atividades sociais, evitando
denominar como culto aquelas atividades que não o são de direito.
5.
Culto e Cultura
Entende-se como a cultura de um
povo o conjunto de crenças, valores, costumes, práticas, tradições, religiões e
símbolos de determinados grupos étnicos. Como tal, a cultura não deve ser
percebida como algo moralmente neutro. A queda do homem afetou profundamente
todas as dimensões de sua existência. As culturas, embora preservando valores
morais e éticos bons por causa da graça comum de Deus, refletem o atual estado
do mundo caído e sem Deus, morto em ofensas e pecados, e por natureza, debaixo
de sua santa ira e condenação. Muitos aspectos culturais são distorções da
revelação natural de Deus (Rm 1.18-31).
Por este motivo, costumes e
hábitos de um povo não devem ser tomados como critérios e referenciais daquele
culto que Deus revelou e que lhe é agradável, como por exemplo, as danças
religiosas que alguns povos incorporaram de longa data em suas tradições e
expressões religiosas. A Palavra de Deus, e ela somente, é a única regra de fé
e prática do seu povo, e é nela que devemos buscar os princípios e elementos
que compõem o culto que Deus busca.
À luz dos preliminares acima,
voltamo-nos agora para a natureza do culto público cristão.
O culto público é alvo de
diversas regulamentações, normas e princípios revelados nas Escrituras.
Lembremos que os quatro primeiros mandamentos da lei de Deus, entre outras
coisas, tratam do culto que devemos prestar a Ele: o primeiro, que devemos
cultuar somente a Deus (Ex 20.3); o segundo, que devemos cultuá-lo em espírito
e verdade e não mediante imagens ou representações (Ex 20.4-6); o terceiro, que
devemos adorá-lo de todo coração, sem tomar seu santo nome em vão (Ex 20.7); e
o quarto, que devemos separar um dia em particular para que descansemos e
cultuemos a Deus (Ex 20.8-11). O fato que Deus reservou quatro dos dez
mandamentos para tratar, também, do culto que a Ele devemos, por si só, é
indicativo do zelo e cuidado que Ele tem pelo mesmo.
Por este motivo, ao tratar do
culto público, a nossa Confissão de Fé declara:
A luz da natureza mostra que há
um Deus que tem domínio e soberania sobre tudo, que é bom e faz bem a todos, e
que, portanto, deve ser temido, amado, louvado, invocado, crido e servido de
todo o coração, de toda a alma e de toda a força; mas o modo aceitável de adorar
o verdadeiro Deus é instituído por ele mesmo e tão limitado pela sua vontade
revelada, que não deve ser adorado segundo as imaginações e invenções dos
homens ou sugestões de Satanás nem sob qualquer representação visível ou de
qualquer outro modo não prescrito nas Santas Escrituras.5
O conceito refletido nesta seção
da Confissão de Fé tem sido chamado na tradição reformada de “princípio regulador
do culto”. Em linhas gerais, o princípio regulador nos ensina que o culto que é
aceitável a Deus é aquele oferecido de acordo com Sua vontade revelada nas
Escrituras (Dt 12.32; Mt 4.9,10; Jo 4.23,24), e que Ele não tem prazer em um
culto onde constam invenções humanas, por mais antigas, atraentes, bem
intencionadas, contemporâneas e razoáveis que possam parecer (Mt 15.9).
Elementos de culto
Do culto público a Deus constam
os elementos, que são aquelas atividades determinadas pelas Escrituras nas quais
o povo de Deus reunido se engaja com o propósito de adorá-lo (Sl 96.9; 99.9),
render-lhe graças e louvor (Sl 100.4; 30.4; 33.2), dar a conhecer as suas
petições (Is 56.7; Fl 4.6), edificar-se internamente (Rm 14.19; 1Co 14.3; Ef
4.16), e anunciar o evangelho ao mundo (1Co 14.24,25).
Na determinação do culto e dos
elementos que o compõem, devemos recorrer às Escrituras Sagradas, nossa única
regra de fé e prática, lembrando sempre que a essência do culto no Antigo e no
Novo Testamento é a mesma. Ainda que sejam administrações diferentes, a aliança
entre Deus e seu povo é uma só. Todavia, ao usarmos o culto do Antigo
Testamento como base para o culto cristão, devemos empregar especial cuidado,
tendo em vista que o mesmo contém diversas cerimônias, partes e elementos que
eram prefigurações de Cristo, sua vida e obra, e que foram abolidos no Novo
Testamento.6 Todos os princípios e
elementos do culto público mencionados no Antigo Testamento e que são
confirmados no culto público revelado no Novo Testamento, quer por preceito,
exemplo, ou inferência legítima, podem e devem ser utilizados para o serviço a
Deus (Hb 9.1-22; Cl 2.16,17).
Nem todas as atividades
realizadas pelos seres humanos são próprias, adequadas ou eficazes para estes
fins elevados. Embora muitas destas atividades não sejam intrinsecamente
erradas em si mesmas, elas não cabem no culto prescrito por Deus. Por este
motivo, o próprio Deus nos revelou em Sua Palavra quais os elementos
apropriados para o seu culto, que são assim definidos por nossos Símbolos de
Fé:7
– orações
– leitura da Palavra de Deus
– pregação da Palavra de Deus
– cantar salmos, hinos e cânticos
espirituais ou sagrados
– celebração da Ceia (quando
houver)
– ministração do batismo (quando
houver)
– juramentos religiosos
– votos, jejuns solenes e ações
de graças em ocasiões especiais
A Confissão de Fé declara que
estes elementos são parte do “culto ordinário” a Deus,9 e os Princípios de Liturgia
que o culto a Deus consta “ordinariamente” destes elementos.10 Estas expressões não
significam que existem “cultos extraordinários” e que “extraordinariamente”
outros elementos, que não os mencionados acima, devam ser incluídos neles. As
Escrituras não reconhecem dois tipos diferentes de culto público a Deus e nem
duas categorias distintas de elementos, ordinários e extraordinários. A
linguagem dos Símbolos de Fé visa tão somente dizer que estes elementos
constituem o padrão do culto a Deus e que não há outro tipo de culto que
devamos prestar-lhe.
A Confissão de Fé menciona que em
“ocasiões especiais” o culto a Deus pode incluir elementos como votos, jejuns e
posteriormente ações de graças pelos livramentos. Estas “ocasiões especiais”
são guerras, calamidades públicas e outros acontecimentos extraordinários que
devem levar a Igreja a buscar o favor de Deus de maneira mais intensa.11
As Escrituras nos ensinam
claramente que Deus não se agrada de um culto onde elementos estranhos são
apresentados (Lv 10.1,2), ainda que sob pretexto de boa intenção (Rm 10.2).
Elas se pronunciam de maneira veemente contra inovações no culto (Dt 12.1-32).
Estas inovações consistem em introduzirmos atividades que não fazem parte dos
elementos do culto público. Os Símbolos de Fé declaram que Deus “… não deve ser
adorado segundo as imaginações e invenções dos homens ou sugestões de Satanás…”.12
Todavia, é possível, e mesmo
desejável, que haja uma variedade saudável quanto à sequência, frequência e
intensidade com que os elementos de culto são empregados. A razão é que as
Escrituras não nos fornecem uma ordem litúrgica fixa e estabelecida, e a
tradição reformada jamais adotou uma liturgia única para todas as suas igrejas.
As Circunstâncias do Culto
Enquanto que a Igreja deva se
restringir zelosamente aos elementos prescritos na Palavra de Deus, conforme
entendidos pelos Símbolos de Fé, existem determinadas circunstâncias referentes
ao bom andamento do culto público (1Co 11.13,14,33,34) que foram deixadas a
critério dos pastores e conselhos das igrejas locais, conforme estabelece a
nossa Confissão:
… há algumas circunstâncias,
quanto ao culto de Deus e ao governo da Igreja, comum às ações e sociedades
humanas, as quais têm de ser ordenadas pela luz da natureza e pela prudência
cristã, segundo as regras gerais da palavra, que sempre devem ser observadas.13
Algumas destas circunstâncias
estão relacionadas com o ambiente de culto, e envolvem decisões quanto à
arrumação do salão, mobiliário adequado e sua disposição no local, a iluminação
e decoração do ambiente, amplificação do som, uso de mídia, a determinação dos
horários de culto, entre outros. Outras circunstâncias estão relacionadas com o
culto propriamente dito, tais como o acompanhamento do cântico congregacional
com instrumentos musicais e cântico através de coros e grupos.
O que diferencia estas circunstâncias
dos elementos do culto é que os elementos são parte essencial do culto a Deus e
foram por Ele prescritos em Sua Palavra, sendo meios pelos quais recebemos a
Sua graça e Sua Palavra e lhe prestamos adoração e louvor. As circunstâncias,
por sua vez, dizem respeito aos passos envolvidos na implementação e aplicação
dos elementos e são dependentes destes. Destarte, as circunstâncias não são
parte essencial e intrínseca do culto, podendo ou não estar presentes, de
acordo com o julgamento dos pastores e conselhos das igrejas locais. A presença
ou ausência de determinadas circunstâncias não torna um culto mais ou menos
espiritual ou aceitável a Deus.
Mudanças históricas nos cultos
Ao longo da história das igrejas
reformadas determinadas mudanças foram aceitas no culto público. Entre elas
mencionamos a inclusão de instrumentos musicais como o piano, o violão, e mais
recentemente, a guitarra e a bateria. Também se incluíram o cântico coral e as
orquestras. Outras coisas caíram no desuso, como o uso da peruca por parte dos
pregadores. Também o uso do cálice comum foi abolido e substituído pelos
cálices individuais, por motivos de saúde pública. O uso de saias pelas
mulheres deu lugar às calças compridas e, em alguns lugares, deixou-se de usar
o véu. Introduziram-se cânticos ao lado dos hinos tradicionais.
Todas estas mudanças, todavia,
dizem respeito às circunstâncias do culto. Nenhuma delas tem a ver com
acréscimo ou diminuição dos elementos do culto público. Assim, o fato de que
mudanças têm ocorrido no culto ao longo da história da IPB não justifica a
inclusão de novos elementos hoje, seja a título de modernidade, adaptação,
contextualização e renovação.
Por causa de sua natureza
circunstancial e secundária, as providências que atendem o culto não devem
tornar-se um fim em si mesmas, nem assumir caráter religioso, tomar o lugar dos
elementos ou impedir que os mesmos sejam utilizados de forma própria, eficaz e
correta pelo povo de Deus. Apesar disto, elas são importantes e seu objetivo é
permitir que o culto a Deus aconteça de maneira adequada, apropriada,
facilitando a sua realização e maximizando o potencial dos elementos (1Co
14.40).
Princípios do Culto Aceitável a Deus
É preciso ressaltar que o culto
aceitável a Deus, além da observância dos princípios e normas quanto aos
elementos do mesmo, inclui determinadas atitudes e características também
preceituadas nas Escrituras e que não devem ser negligenciadas. O Senhor Jesus
nos ensina que devemos adorar a Deus “em espírito e verdade” (Jo 4.23-24). No
contexto em que o Senhor Jesus proferiu estas palavras, que é o encontro com a
mulher samaritana e a discussão sobre o local da adoração a Deus (João
4.19-23), adorá-lo em espírito significa não adorá-lo em um único local sagrado
e exclusivo, como era o templo de Jerusalém, mas em qualquer lugar, desde que a
atitude esteja certa. O que importa não é “onde”, mas “como”. Por ser Espírito,
Deus não estava contido naquele templo ou no monte Gerizim, sagrado para os
samaritanos, e onde antes havia um templo (Jo 4.20). Os adoradores que Ele
busca são aqueles que o adoram com a atitude interior aceitável e de acordo com
a verdade por Ele revelada aos judeus, em contraste com o culto falso dos
samaritanos (Jo 4.22). Portanto, a declaração “adorar a Deus em espírito” não
pode ser usada para se justificar um culto “livre” e ao sabor dos sentimentos e
imaginações do condutor no momento. Esta interpretação é uma distorção do
sentido das palavras do Senhor Jesus.
Além da adoração em espírito e
verdade, as Escrituras destacam a sinceridade de coração, a humildade, o
espírito quebrantado, uma santa alegria e gozo na presença do Senhor, a busca
da edificação e o reconhecimento que o Deus Triúno é o centro do culto. A
solenidade diante do Senhor que caracteriza o culto público não é o oposto da
alegria e da exultação em estarmos na presença do Pai. As duas coisas devem
andar juntas, enriquecendo a nossa experiência de culto (Hb 12.28,29; Sl 100.1;
84.3).
As Escrituras também nos falam do
culto que Deus não aceita. Este é marcado não somente pelos acréscimos e
invenções humanos, mas pela hipocrisia (Isaías 1), pela inimizade nos corações
dos adoradores (Mt 5.23-24), pelas divisões internas nas igrejas locais (1Co
1—4 e 11; Gl 5.14-15), pela falta de ordem e falta de inteligibilidade (1Co 14),
pela entrega de ofertas que simbolizam a falta de amor e de consagração a Deus
(Ml 1), pela vida imoral do povo e dos seus líderes (Ml 2) e servir ao Senhor
de maneira displicente (Is 58.1-10; Mq 6.6-8; Gl 6.7).
Assim, ao mesmo tempo em que
tratamos de questões relacionadas aos elementos e circunstâncias do culto
público, não podemos esquecer que a vida, a conduta e a atitude do povo e de
seus líderes são igualmente importantes para o culto que Deus aprova.
A Responsabilidade pela
Condução do Culto
Embora todos os adoradores sejam
responsáveis para que o culto a Deus seja oferecido de acordo com seus
preceitos, a responsabilidade da condução do mesmo recai sobre o pastor da
igreja local, de quem a liturgia do culto é função privativa, conforme a
Constituição da nossa Igreja.14Assim, devem os pastores zelar para
que o culto a Deus oferecido nas igrejas onde pastoreiam transcorra não somente
de acordo com os padrões bíblicos no que se refere aos seus elementos e
circunstâncias, como também quanto à vida e atitude dos adoradores.
O ministro não é livre para
inventar elementos ou conduzir o culto público em princípios contrários às
Escrituras interpretadas pelos Símbolos de Fé. Existem várias resoluções
emitidas pelo Supremo Concílio e sua Comissão Executiva que colocam os limites
apropriados à função litúrgica do pastor. De acordo com elas, a liturgia é
prerrogativa do pastor da Igreja local, podendo o presbitério ao qual a igreja
é jurisdicionada supervisionar os cultos com vistas à conformidade com os
padrões de fé da denominação. Isto significa que os presbitérios podem
interferir quando a prática cúltica das igrejas jurisdicionadas fugir aos
padrões e preceitos denominacionais. Da mesma forma, os conselhos das igrejas
locais devem zelar juntamente com o pastor para que o culto seja realizado de
acordo com estes padrões e preceitos.15
Diante da seriedade do culto
público, a sua natureza e a responsabilidade dos pastores em sua condução, o
Supremo Concílio orienta seus ministros a que não abram mão de sua prerrogativa
constitucional quanto à liturgia, entregando a elaboração e a condução do culto
a outras pessoas, que por mais piedosas e sinceras que sejam, não foram
preparadas nem ordenadas para tal. E que, sendo necessária esta delegação, que
o pastor elabore e acompanhe a condução do culto, permanecendo o responsável
final pelo mesmo.
EXPRESSÕES CORPORAIS NO CULTO
Algumas expressões corporais
encontram lugar no culto público, conforme nos ensinam as Escrituras, como uma
maneira de expressão dos sentimentos que perpassam o coração da comunidade
enquanto adora. Assim, encontramos referências no Antigo Testamento ao elevar
as mãos a Deus e olhar para os céus durante a oração como expressão de enlevo e
dependência de Deus (1Re 8.54), o ajoelhar-se diante dele, como sinal de contrição
e quebrantamento (2Cr 6.13).
No culto do Novo Testamento
encontramos referências ao levantar as mãos (1Tm 2.8) e ao ajoelhar-se (At
20.36) como expressões simbólicas dos sentimentos religiosos durante o culto.
As Escrituras também mencionam
outras expressões de natureza religiosa através do corpo, como danças, embora
não no contexto do culto público de Israel a Deus ou do culto cristão. As
danças são mencionadas mais de 25 vezes nas Escrituras, em contextos de festa
popular (Jz 21.21,23; Ct 6.13; Mt 11.17; Lc 7.32; 15.25), vitórias militares
(Ex 15.20; Jz 11.34; 1Sm 18.6; 21.11; 29.5; 2Sm 6.14,16; 1Cr 15.29; Jr 31.4,13;
Lm 5.15), expressão de exultação religiosa (Sl 150.4) e de festividades pagãs
(Ex 32.19; Mc 6.22). Note-se que tais ocorrências não se referem a danças no
contexto do culto público oferecido a Deus, quer no Antigo Testamento ou no
Novo Testamento. Além disto, a quase totalidade destas menções é encontrada em
passagens histórico-descritivas, o que dificulta usá-las como norma para o
culto do Novo Testamento. Considere-se a dificuldade de se fazer normas ou
estabelecer princípios gerais para a vida da igreja simplesmente a partir de
atos, ações, eventos e incidentes envolvendo as personagens da Bíblia.
Danças Litúrgicas e Coreografias
A expressão “danças litúrgicas” é
geralmente aplicada às seguintes atividades: (1) as danças da congregação ao
som de música durante o cântico; (2) as danças realizadas por indivíduos ou
grupos à frente da Igreja, em determinado momento da liturgia, e que pretendem
transmitir a Palavra de Deus ao povo, ilustrando ou dramatizando uma mensagem
musical durante o culto público. Estas últimas são também chamadas de
coreografias.
Antes de tratarmos delas, é
preciso esclarecer que o dançar em si não é necessária e intrinsecamente errado
e pecaminoso, a começar do fato que encontramos diversas ocasiões no Antigo
Testamento em que membros individuais do povo de Deus dançaram. É nesse sentido
que encontramos exemplos no Antigo Testamento de danças como expressão popular
de alegria por vitórias militares dadas por Deus (Ex 15.20; Jz 11.34; 1Sm 18.6)
ou expressão individual desta mesma alegria (2Sm 6.14). Mesmo que não
encontremos no Novo Testamento qualquer referência a danças por parte de
cristãos, entendemos que o ato de dançar em si não é intrinsecamente contrário
ao cristianismo, a não ser quando dançar envolva e promova a impureza sexual e
comprometa o testemunho cristão diante do mundo.
No que tange às danças
litúrgicas, não é possível demonstrar pelas Escrituras que elas faziam parte do
culto público a Deus, quer no período do Antigo Testamento ou do Novo
Testamento e nem que as mesmas são elementos do culto por Ele ordenado. As
passagens bíblicas geralmente mencionadas para defendê-las – como a dança de
Miriã e das demais mulheres, a dança de Davi diante da arca, a dança da filha
de Jefté – poderiam, no máximo, provar que cristãos individuais podem
eventualmente se alegrar com os atos salvadores de Deus e espontaneamente
dançar de alegria fora do ambiente de culto.
A exortação do Salmo 150, “Louvai
a Deus no seu santuário; louvai-o no firmamento, obra do seu poder… louvai-o
com adufes e danças..” (Sl 150.1 e 4) tem sido entendida pelos irmãos
defensores das danças litúrgicas como prova de que as danças faziam parte do
culto oferecido no santuário de Jerusalém. Todavia, um exame mais acurado da
passagem revelará que o “santuário” referido pelo salmista é o firmamento, de
acordo com o paralelismo hebraico usado aqui, e não o templo de Jerusalém:
Louvai a Deus no seu santuário; Louvai-o
no firmamento, obra de seu poder.
Percebe-se que o santuário
mencionado na primeira linha do versículo é o firmamento, mencionado na segunda
linha. Encontramos o mesmo paralelismo no Salmo 11:4: O Senhor está no seu
santo templo; Nos céus tem o Senhor o seu trono.
Fica evidente que o santo templo
de que fala o salmista são os céus onde Deus tem o seu trono. Outra passagem é
o Salmo 102.20:
O Senhor observa do alto do seu
santuário; Lá do céu ele olha para a terra.
Aqui encontramos mais uma vez o
paralelismo que estabelece que o santuário de onde Deus olha para a terra é o
céu onde Ele habita. Ou seja, estas passagens dos salmos não provam que havia
danças no templo de Jerusalém durante os cultos a Deus. Elas simplesmente
conclamam toda a criação a adorar o Deus que habita nos céus.
Assim, tais passagens e as outras
acima mencionadas e analisadas, não podem servir de base para justificar
práticas tais como danças durante o louvor por parte da congregação, a
existência de um grupo de dança litúrgica para realizar coreografias durante o
culto, a “criação” do dom da dança santa e a organização de ministérios de
dança litúrgica nas igrejas locais. No caso das expressões corporais realizadas
com as crianças nos departamentos infantis, consideramos as mesmas como
apropriadas para a instrução dos infantes, não devendo, todavia, ser incluídas
como parte do culto público oferecido pela igreja.
As danças litúrgicas e as
coreografias não estão incluídas na relação dos elementos de culto citados nos
nossos Símbolos de Fé. Também não se pode incluí-las nos cultos públicos a
pretexto de serem meras circunstâncias. As danças não são circunstâncias
ligadas à Palavra, pregada ou cantada, como se fossem uma encenação ou
dramatização da mensagem de Deus, visto que não contribuem para que a Palavra
seja mais bem compreendida pelo povo de Deus e têm a tendência, ao contrário,
de obscurecer o seu significado e sua mensagem, desviando o foco e a atenção da
comunidade.16 E, além disto, não
encontramos nas Escrituras qualquer orientação para que transmitamos a mensagem
de Deus ao seu povo mediante o ato de dançar, como se o mesmo fosse um meio
eficaz para tal.
Na realidade, os Reformadores
aboliram do culto público as dramatizações dos mistérios que eram populares
durante a Idade Média, considerando que não existe um meio mais eficaz para se
transmitir a palavra do que a entrega da mesma mediante a pregação e o ensino.17
Todavia, existem diversos
exemplos de expressões lúdicas dos sentimentos religiosos feitos diante de Deus
em outras ocasiões. Dessa forma, enquanto não se podem admitir as danças no
culto público, quer nos templos das igrejas ou em quaisquer outros locais onde
o culto público é realizado, por outro lado é possível reconhecer que as danças
são atividades legítimas quando realizadas fora do ambiente litúrgico, como
atividades culturais das igrejas locais, e nestes casos, sempre a critério de
seus conselhos e desde que não provoquem a sensualidade ou escândalos.
Fortes Expressões Corporais
Determinados ritmos musicais
tendem a provocar movimentos do corpo, tais como balanços, meneios e gingas,
distanciando os adoradores dos princípios que regem o culto bíblico. Cabe aos
pastores das igrejas locais instruírem, ensinarem e orientarem a congregação
quanto à natureza do culto a Deus, do louvor que a Ele é devido, e do potencial
que estes movimentos corpóreos têm para provocar a sensualidade e afastar a
mente e o coração do propósito central do culto, que é adorar a Deus, sempre
seguindo os princípios que revestem o culto a Deus de sobriedade, temor e bom
senso.
Palmas
A expressão “bater palmas” ocorre
apenas no Antigo Testamento. Para os judeus, bater palmas podia expressar ira
(Nm 24.10; Ez 21.17; 22.13) e desprezo (Jó 34.37; Lm 2.15; Naum 3.19). No
Antigo Oriente, as palmas eram usadas para manifestar aprovação pela queda dos
inimigos (Jó 27.23; Ez 6.11; 25.6), pela prosperidade do justo (Is 55.12) e
como aplauso em cerimônias de aclamação dos reis (2Re 11.12). Nenhuma das
ocorrências sobre palmas no Antigo Testamento se refere à marcação rítmica de
cânticos religiosos, quer no templo ou em outro lugar.
Este fato de imediato nos leva à
conclusão que bater palmas durante os cânticos, ou deixar de fazê-lo, não torna
tais cânticos mais ou menos aceitáveis diante de Deus. Também, que as palmas
não devem ser usadas para aferir a espiritualidade e o fervor dos cultos de uma
igreja e de seus participantes e que jamais devem ser vistas como expressão de
espiritualidade.
Apesar de o assunto ter sido
enviado várias vezes ao Supremo Concílio e sua Comissão Executiva, a IPB não
tomou até o presente uma decisão de proibir ou admitir as palmas nos cultos
públicos das igrejas federadas. A única resolução sobre o assunto foi a de
reconhecer como legítima a decisão de um presbitério que proibiu palmas nos
cultos das igrejas sob sua jurisdição.18 Esta resolução não entrou no
mérito da atitude do presbitério.
Aplausos
Há duas passagens nos Salmos onde se convida a aplaudir
a Deus por seus atos majestosos e poderosos, como expressão de exultação,
gratidão, honra e louvor (Sl 47.1; cf. Sl 98.4). No Antigo Oriente, era costume
aplaudir-se os reis como forma de demonstração da sujeição, gratidão e respeito
de seus súditos, em reconhecimento de suas vitórias e conquistas, ou durante a
sua coroação (2Re 11.12). A linguagem destes Salmos é tirada da cerimônia de
coroação dos reis de Israel e usada para se referir a Deus como o supremo Rei
sobre toda a terra. Estas passagens não provam que aplaudir a Deus era uma das
partes do culto público a ele prestado em Israel. Além disto, não há qualquer
referência a isto no Novo Testamento. Desta forma, carece de fundamentação a
prática de “palmas para Jesus!” equivocadamente introduzida em muitas igrejas
evangélicas hoje.
O aplauso a homens durante o
culto se constitui numa violação de um dos princípios centrais do culto a Deus,
que é a sua teocentricidade. “Não a nós, Senhor, não a nós, Senhor, mas ao teu
nome dá glória” (Sl 115.1). Aplaudir corais, coros e grupos após terem
participado da liturgia torna tais participações em espetáculo, show e
apresentações, tornando estas circunstâncias em fins em si mesmas, desvirtuando
o seu caráter secundário e tornando o culto a Deus em culto centrado no homem.
O Supremo Concílio, diante das
evidências bíblicas e confessionais relativas à importância do culto público,
determina aos seus pastores, oficiais, igrejas e membros a que procurem
congregar-se com frequência para prestar serviço espiritual a Deus, não
substituindo o culto público pelo culto individual ou familiar (Hb 10.25). E
que valorizem a sua presença no culto público, para ele se preparando em
conformidade com o que determina os Catecismos da IPB.19
O Supremo Concílio entende que as
danças não fazem parte do culto público revelado por Deus, e assim, determina a
seus pastores, concílios e igrejas federadas a que não incluam no culto a Deus,
independentemente do local onde este culto está sendo oferecido, as chamadas
danças litúrgicas, coreografias, ministérios de danças, danças proféticas ou
quaisquer outras variações afins, inclusive a pretexto de que são
circunstâncias do culto.
O Supremo Concílio reconhece que
as danças são uma expressão cultural e que podem ser realizadas nas atividades
culturais das igrejas locais, desde que não em ambiente de culto, e desde que
não provoquem a lascívia, a sensualidade e escândalos.
O Supremo Concílio entende que
fortes expressões corporais no culto, como meneios do corpo e gingas, mesmo não
se constituindo em danças, tendem a distrair a atenção dos adoradores e em
alguns casos, a provocar a sensualidade. Destarte, o Supremo Concílio determina
aos seus pastores, concílios e igrejas federadas que tais expressões sejam
evitadas e que os pastores e presbíteros exerçam, pastoralmente, a supervisão
deste assunto, procurando de maneira suasória orientar e conduzir o rebanho sob
sua jurisdição.
O Supremo Concílio entende que
compete aos conselhos e presbitérios orientarem e determinarem às igrejas sob
sua jurisdição quanto ao bater palmas, ou não, durante os cultos. O Supremo
Concílio determina aos seus pastores e concílios a que instruam estas igrejas
que as palmas não indicam maior liberdade espiritual no culto, resumindo-se a
mero acompanhamento rítmico, onde couber. E que em todas as coisas, usem de
sabedoria, bom senso e prudência para evitar conflitos, divisões e contendas no
meio do povo de Deus.
O Supremo Concílio suplica a Deus
que a presente Carta Pastoral seja usada por Ele para que o culto que lhe
prestamos esteja mais e mais de acordo com Sua Palavra e para que nossa
denominação goze de paz e harmonia em todos os recantos desta nação.
3 CFW XXI.6. Muito embora nossos Princípios de Liturgia
se refiram ao templo das igrejas como a casa de Deus (PL Art. 5), entende-se que
não estão com isto emprestando à edificação física onde se reúnem as igrejas
locais qualquer conotação sagrada, à semelhança do templo de Jerusalém no
Antigo Testamento, local específico da revelação divina e do oferecimento dos
sacrifícios.
7 CFW XXI.5 e PL Art § 8º. Ver ainda: Fp 4.6, 1Tm 2.1; Ef 5.19; Sl
100.2; Cl 3.16; 2Cor 8.1—9.15; 2Tm 4.2; Lc 4.16; At 15.21; 20.7; Dt 6.13; Ne
10.29; Ec 5.4,5; Jl 2.12; Mt 9.15; 1Co 11.23-29; At 20.7.
8 A bênção apostólica não consta
da relação de elementos de culto, quer na CFW quer no PL. Ela é prevista na
CI-IPB Art. 31, que diz apenas que sua impetração é prerrogativa exclusiva dos
pastores. Sua não inclusão nas listas de elementos, portanto, não a torna
obrigatória ao final dos cultos. A questão das línguas e profecias durante o
culto já foi tratada pelo Supremo Concílio da IPB em sua Carta Pastoral sobre o
Espírito Santo, aprovada no SC-IPB/1998, doc. CXIX.
12 CFW XXI.1. Veja ainda as
seguintes partes dos Símbolos de Fé que nos orientam a não inventarmos maneiras
de se adorar a Deus, e que nos conclamam a nos opor aos cultos falsos:
Catecismo Maior perguntas 108 a 109; Breve Catecismo perguntas 50 a 52.
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