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SALMO 131





O Salmo 131 faz parte de um conjunto de 15 salmos, do 120 ao 134 que aparentemente eram usados como cânticos nas romarias dos peregrinos ao monte Sião para adorar.
Segundo Franz Delitzsch, teólogo Luterano Alemão do Século XIX, este salmo é uma pequena canção como eco de resposta a zombaria de Mical quando Davi dançou diante da arca em 2 Samuel 06:21, como se dissesse “estimo-me ainda menos do que eu pensas, e eu apareço bem menor aos meus próprios olhos”.  David é o modelo do estado de espírito que o poeta expressa. Ele não se promove. Não tomou posse do trono violentamente, mas depois de Samuel o ungiu,  ele de bom grado e com paciência espera 10 anos suportando a perseguição de Saul. Ele deixou inteiramente a Deus a tarefa de remover Saul e Isbosete. Submissão, renúncia, e orientação de Deus, o contentamento com o que foi atribuído a ele, são os traços distintivos do seu caráter nobre.
Uma das características destes Salmos é que apresentam também “degraus” que devem ser escalados na nossa vida. Cada verso de alguma forma se relaciona com o anterior, sendo um posto mais elevado na nossa comunhão com Deus.
Faz parte ainda de um conjunto de Salmos que expressam uma tremenda confiança do Salmista para com Deus. Mesmo que em muitos outros Salmos exista a manifestação dessa confiança os Salmos 23, 121 e este 131, têm como único tema a confiança. São Salmos curtos onde se usam fortes e marcantes metáforas para explanar como se sentia o Salmista em relação a Deus.
Este Salmo foi composto por Davi, e curiosamente como nos outros dois Salmos citados, a relação do autor com Deus faz o autor ao mesmo tempo tema do Salmo.
É um Salmo curto, talvez se fosse feito hoje em dia alguns não o chamaria de Hino, mas talvez de cântico, ou para os mais antigos um corinho.
Porém conforme Spurgeon esse é: “um dos salmos mais curtos de ler, porém um dos mais longos para aprender. “
Mesmo que usando como metáfora a relação de um bebê recém-desmamado, abarca uma sabedoria que só uma pessoa vivida ao longo de muitos anos pode adquirir.
Despretensão e humildade unidas;
·      Num coração santificado;
·      Numa vontade submissa à mente de Deus; e
·      Numa esperança dirigida somente ao Senhor.
O Salmo 131 como é característica deste tipo de abordagem tem dois personagens: O salmista, aqui Davi, e Deus.
O Salmo é uma conversa solitária dele com Deus, não um discurso diante dos homens.
Quando falamos com Deus já temos o publico suficiente e necessário.
Como dito antes esse Salmo é um dos Salmos dos Degraus.
Esse só tem três degraus, pode até parecer que seria mais fácil de ser galgado, no entanto ele nos traz degraus altíssimos e sobremodo complexos.
Trata-se de uma escada curta, porém de altos resultados, que vão da profunda e verdadeira humildade até a profunda e verdadeira confiança.
Vamos então passear um pouco pelos três degraus do Salmo 131





Primeiro Degrau – A Humildade
No primeiro verso deste Salmo vemos três sentenças:

1. Senhor, não é soberbo o meu coração.
Davi faz uma declaração que muitos considerariam ousada diante de Deus. Justamente diante de Deus que nos conhece como diriam os mais antigos pelo direito e pelo avesso.
Outros ainda poderiam arguir que a própria afirmação já denotaria soberba. Já ouviram falar do cara que era tão humilde que se orgulhava da sua enorme humildade?
Mas temos que enxergar aqui que com esta afirmação Davi não queria se auto rotular como O HUMILDE e sim demonstra uma disposição de ser ou tentar ser, que é o que Deus espera de nós. Deus não requer de nós a perfeição, pelo menos enquanto aqui estamos, mas sim a disposição de tentar alcança-la.
Sua confissão aqui representa o seu propósito sincero e esforço constante, e que predomina a disposição de sua alma.
Dito isso, podemos dizer que Davi efetivamente entendia e sabia da responsabilidade do que falava.
É como se ele dissesse: "Senhor, de quem nada está escondido, tu sabes que esta é a disposição da minha alma Se eu tenho alguma coisa, é de ti, é a tua providência que me trouxe de após as ovelhas e com os jovens para alimentar e governar o teu pessoas. " – Spurgeon.
Ele começa pelo coração certamente porque ele é o centro de nossa natureza, e é lá onde nosso orgulho se instala e contamina tudo mais que há dentro de nós.
É notável o conhecimento que Davi tinha de si mesmo. Não que nós não nos conheçamos. Nos conhecemos, mas nos enganamos muitas vezes.
É importante nos analisarmos e nos conhecermos para que possamos declarar como Davi, ao retirarmos de nosso coração o orgulho desmedido, que não somos soberbos.

2. Nem altivo o meu olhar
Orgulho tem a sua sede no coração, mas sua principal expressão está no olho.
Aqui fica claro que Davi não se colocava como superior. O Homem que mais tarde seria chamado como aquele que era segundo o coração de Deus, não se entendia como alguém superior que poderia usar de arrogância no tratamento com quem quer que fosse.
A expressão: Olhar de cima para baixo, não fazia parte do vocabulário, nem do dia a dia dele.
Segundo Matthew Henry, Pastor Presbiteriano Inglês do Século XVII, Ele não tinha nem um olhar de desprezo. Ou olhar de inveja sobre aqueles que estão acima de mim, ou olhar de desprezo para aqueles que estão abaixo de mim. Onde há um coração orgulhoso, há geralmente um olhar orgulhoso (Provérbios 06:17).
Mais uma vez a expressão de humildade aqui, não uma humildade aparente e forjada para agradar aos outros, mas um reconhecimento verdadeiro que diante de Deus somos todos igualmente pó.
Quando o coração está certo, e os olhos estão bem, o homem está numa condição saudável e feliz.

3. Não ando a procura de grandes coisas nem de coisas maravilhosas demais para mim.
Davi sabia de sua importância e de sua grandeza para a história de Israel, mas mesmo assim com sabedoria não buscou se intrometer naquilo que não lhe era dado como tarefa por Deus. Diferentemente de Saul, antes dele, e de Uzias, depois dele, Davi não se aventurou a usurpar a funções de Sacerdote.
Os grandes propósitos de Deus que lhes eram oculto, não lhe importavam. Muitas vezes pode ter se questionado porque da demora de se concretizar a sua assunção ao trono, mas esperou pacientemente.
Ele tinha consciência daquilo que Deus tinha colocado como sua responsabilidade e não almejava postos, posições para as quais não tinha sido preparado e escalado.
A consciência de suas limitações e de suas atribuições com o desejo sincero de cumpri-las diligentemente.
O ideal de Davi era de serviço e não de reconhecimento humano por posições pessoais. Nada de almejar postos de destaques, apenas o desejo de servir e ser usado por Deus.
Um homem faz bem em conhecer seu próprio tamanho e sua própria capacidade, e será certamente um tolo se visa aquilo que está além do seu alcance, com um esforço inútil, muitas vezes ferindo a si mesmo.
A vaidade humana nos leva muitas vezes a desprezar o trabalho para o qual somos talhados e que nos foi dado porque sempre desejamos aquele trabalho para o qual nunca fomos chamados apenas pelo destaque que ele nos aufere, querendo assim ser admirado. Na experiência humana vemos que aqueles que só se interessam pelas grandes atribuições são os que sempre vivem estressados em cumpri-las, mesmo que nunca consigam, e ansiosos pelas novas grandes atribuições, maiores que as atuais.


Segundo Degrau – O Silêncio, O Sossego e A Quietude
No verso 2 deste salmo vemos duas ações de Davi

1. Pelo contrário fiz calar e sossegar a minha alma
No texto em hebraico usado essa frase é feita como uma forma de juramento.
Davi subjuga sua vontade, domina seu próprio espirito, para não ser rebelde em relação a Deus e a Sua Santa Vontade.
Aquietar-se e calar-se diante de situações críticas não é fácil. Há um provérbio chinês que diz que é mais fácil um homem acalmar o mar e governar o vento do que aquietar a si mesmo. É claro uma hipérbole, um exagero, mas reflete aquilo que somos. Somos clamorosos, inquietos, petulantes, autossuficientes; e nada senão a graça pode nos aquietar sob aflições, irritações e desilusões.

2. Como a criança desmamada se aquieta nos braços de sua mãe.
Todo mundo que já teve filho sabe como é bonito  imagem da criança repousando serena e tranquila no braço de sua mãe após mamar. Pode-se dizer que seja uma das imagens mais belas que se possa comtemplar. A tranquilidade e quietude que um momento como esse reflete é ímpar.
Aqui Davi como uma criança recém-amamentada por sua mãe fica quieto e contente. Os orientais adiavam o tempo do desmame muito mais do que nós, e podemos concluir que o processo não é mais fácil por ser adiado. Por fim é preciso dizer um basta para o período de amamentação, e então começa uma batalha: é negado à criança seu consolo, e ela chora e se irrita, ou fica amuada. Está enfrentando sua primeira grande tristeza e está aflita. Mas o passar do tempo traz não só alívio, mas o fim do conflito; o menino logo está comendo à mesa com seus irmãos e nem deseja retornar àquela fonte que lhe sustentava a vida. Não está mais zangado com a mãe, mas procura o aconchego no seu colo. Para a criança desmamada sua mãe é seu consolo, embora lhe tenha negado consolo. 
"Minha alma. como a criança desmamada, descansa.
 Eu paro de chorar.
 Assim o colo da mãe, mesmo seco o seu peito, 
Pode embalar." 

John Gill, Batista Calvinista Inglês do século XVII cita que no Targum há o seguinte comentário sobre esse texto: "como um desmamados sobre os seios de sua mãe, eu sou fortalecido na lei."
É bênção, um marco de crescimento, de sair da infância espiritual, quando podemos sacrificar as alegrias que um dia pareciam essenciais, e achar consolo naquele que as nega: isso é maturidade, e toda reclamação infantil se vai. Se o Senhor tira nosso mais apreciado deleite, curvamo-nos à sua vontade sem um murmúrio; fazemos isso com o prazer que vem da humildade, o cabo que sustenta a flor em que desabrocha a paz.
 Não é todo filho de Deus que é logo desmamado. Alguns são infantes quando já deveriam ser pais; outros são difíceis de desmamar, choram, brigam contra a disciplina do pai celeste. Quando nos achamos desmamados descobrimos, para tristeza nossa, que os velhos apetites estão mais machucados do que mortos. Com certeza centenas já cantaram este salmo muito antes de compreendê-lo. Benditas são aquelas aflições que subordinam nossos sentimentos, que nos desmamam da autossuficiência, que nos ensinam a maturidade cristã, que nos ensinam a amar Deus não meramente quando ele nos consola, mas mesmo quando ele nos sujeita a provações. Tal desmame de si emana da humildade suave declarada no verso primeiro, e em parte explica a sua existência. Se o orgulho acabou, a submissão com certeza virá; e por outro lado, se o orgulho deve ser afugentado, o "eu" também precisa ser vencido.


Terceiro Degrau – A Paciência e A Confiança
Davi conclui esse lindo Salmo com a seguinte afirmação
Espera, ó Israel, no Senhor, desde agora e para sempre.
Aqui vemos o incentivo de Davi para que o povo que ele governava siga seu exemplo de esperar em Deus, o Deus que faz a aliança e o Deus que sustém a aliança.
Após o seu próprio exemplo, o Rei de Israel, que assim se humilhara em suas aflições, humilde, contente, e resignado, lançando todo o seu cuidado sobre o Pai, que cuidou dele, e esperando pacientemente seu tempo para a libertação e salvação; incentiva seu povo na fiel esperança e na confiança, não em si mesmos, em sua sabedoria, ou em seu poder, mas em Jeová apenas, que não vai deixar de exaltá-los, no momento certo de acordo com Seus planos.
É como se Davi dissesse lembremos que Ele é Deus e:
  • ·      Tem um sábio plano;
  • ·      Tem um bom propósito;
  • ·      É poderoso para executá-lo; e
  • ·      Não negará nada de bom aos que andam na retidão.

O efeito dessa esperança se verá:
  • ·      Na humildade e a dependência no primeiro verso; e
  • ·      No contentamento e tranquilo desmame do segundo verso.

Confiança "desde agora e para sempre."

Conclusão
Se você ainda não começou, Comece agora e pelo poder e misericórdia de Deus a mantenha para sempre.
O passado de Israel, e certamente o nosso passado nos autoriza a ter essa confiança.

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